O Brasil a por um momento decisivo quando o assunto é preservação ambiental. Entre as várias ameaças que colocam em risco todo a rica biodiversidade brasileira está o Projeto de Lei (PL) 2.159/2021, que flexibiliza as regras do licenciamento ambiental em nosso país. O texto foi aprovado no Senado Federal, em um placar de 54 votos a favor e 13 contra, no último dia 21 de maio. Esse projeto, que está sendo chamado de ‘PL da Devastação’, se encontra na Câmara Federal e pode ser colocado em votação a qualquer momento. Sendo aprovado pelos deputados vai para a sanção do presidente que poderá vetá-lo total ou parcialmente.
Muitos estão vendo esse Projeto de Lei como um grande retrocesso na defesa ambiental. Um dos motivos é a criação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que tem como base a autodeclaração, enfraquecendo o papel de órgãos técnicos e retira a obrigatoriedade de análises mais rigorosas para atividades poluentes. Além disso, o projeto a a permitir que estados e municípios definam critérios próprios de licenciamento, aumentando os riscos de corrupção, insegurança jurídica e diferenças regulatórias.
Durante a votação no Senado, o presidente da Casa, Davi Alcolumbre, ainda incluiu no PL a Licença Ambiental Especial. Esse acréscimo no texto, entrega ao Conselho de Governo as decisões sobre a classificação de projetos como “estratégicos”, permitindo a aprovação deles com base em critérios políticos e não técnicos.
Essas são apenas algumas das consequências do PL 2.159/2021, que flexibiliza a fiscalização ambiental no Brasil. Em Rondônia, entidades que atuam com as questões ambientais já manifestam preocupação com o que pode ocorrer, caso esse projeto seja sancionado pelo presidente da República.
Perigo
Para o presidente da Organização Ecoporé, Marcelo Ferronato, que atua na área socioambiental em Rondônia, existe a necessidade de modernização da legislação ambiental brasileira, que está em vigor e envolve o licenciamento ambiental.
“Porém, isso não significa necessariamente a flexibilização. Na minha opinião, estão aproveitando esses argumentos dos mecanismos burocráticos que foram estabelecidos ao longo do tempo no licenciamento e que, propositalmente ou não, não acompanharam a evolução tecnológica e que precisam se modernizarem para serem mais ágeis. Como isso não ocorreu, não houve investimentos maciços para um licenciamento mais eficiente, estão aproveitando um falso argumento de morosidade como se isso fosse um entrave burocrático, para flexibilizar mecanismos que servem para preservar a integridade do ambiente em benefício de toda sociedade”, avaliou.
Marcelo afirmou também que está vendo com muita preocupação a possibilidade de não ter análises técnicas para empreendimentos que vão, de alguma forma, impactar no equilíbrio do meio ambiente.
“Vejo que o que está se colocando com esse Projeto de Lei, é um mecanismo extremamente simplório, onde você vai licencia e autodeclara. Imagina, a pessoa se autodeclarar que não vai ter impacto ambiental. Imagina o tamanho da tragédia disso! Pra mim, é um desalento de tamanha grandeza o que estão fazendo com a legislação ambiental do país e de Rondônia. Triste! Ficamos de mãos atadas, porque essas pessoas estão eleitas e estão com as tomadas de decisões. Infelizmente, quem vai pagar é a sociedade. Como diz aquele ditado: ‘privatiza-se os lucros e socializa-se os prejuízos’. Muita gente vai se aproveitar dessas simplificações para destruir o ambiente e não cumprir normas que até então estavam estabelecidas e contribuíam para os mecanismos de conservação”, declarou.
Para Marcelo Ferronato, da Ecoporé, existe a necessidade de modernização da legislação ambiental brasileira, mas isso não quer dizer flexibilzação
Futuro da Amazônia
A indigenista Neidinha Suruí, da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, que há mais de 30 anos milita em prol de povos indígenas e das questões ambientais da Amazônia, também se mostra preocupada com as consequências do PL 2.159/2021 nas comunidades tradicionais e na biodiversidade de nossa região.
“Esse projeto coloca em risco o futuro da Amazônia e de seus povos e o desenvolvimento econômico responsável. O estímulo ao autolicenciamento, aliado à dispensa de estudos técnicos rigorosos em empreendimentos com potencial poluidor, abre caminho para a expansão descontrolada de empreendimentos sobre áreas sensíveis, promovendo grilagem, desmatamento e conflitos fundiários, e destruição de recursos hídricos. A destruição dos ecossistemas amazônicos compromete não apenas a vida e a dignidade das populações locais, mas também afeta diretamente o clima, a disponibilidade hídrica e a qualidade do ar em todo o território nacional”, alertou.
Para Neidinha, o desequilíbrio ambiental não respeita fronteiras e o impacto atinge tanto o campo quanto as cidades. A proposta, disse ela, traz a promessa de agilidade e redução de custos operacionais no curto prazo, mas essa desregulamentação traz riscos severos para a estabilidade econômica de médio e longo prazo.
“A ausência de uma análise ambiental criteriosa pode resultar em desastres socioambientais com alto custo de reparação, judicialização de obras, insegurança jurídica e perda de credibilidade internacional — especialmente em mercados que priorizam cadeias produtivas sustentáveis. Essa flexibilização ocorre em um momento crítico: estamos cada vez mais próximos do ponto de não retorno das mudanças climáticas, como vem apontando cientistas, estudiosos e o processo de colapso que a Amazônia vem apresentando. A destruição de florestas, rios e nascentes prejudica a regulação térmica, os ciclos da água e do carbono, intensificando secas e inundações”, finalizou.
A indigenista Neidinha Suruí, da Kanindé, também critica o PL afirmando que ele coloca em risco o futuro da Amazônia, de seus povos e o desenvolvimento econômico responsável