O Exército brasileiro conseguiu um feito inédito. Promover a encenação de uma absurda ópera bufa nos escombros da construção do Teatro Estadual, antes mesmo do reinício das obras, paralisadas há cerca de dez anos.
Absolutamente disparatada a ação pirotécnica do Exército, rasgando a Constituição Federal como nos mais sombrios tempos da ditadura militar, ao ocupar em armas o terreno onde se acha erguida uma carcaça do que seria ou será o nosso Teatro Estadual.
O Exército cometeu inequívoco abuso de poder, porque ninguém e nenhuma instituição brasileira está acima da Constituição, nem mesmo o Exército, que lamentavelmente esqueceu que em nosso País impera um estado democrático de direito.
A Constituição Federal estabelece no 5º, XXXVII que não haverá no País juízo ou tribunal de exceção, o que significa dizer que a ninguém é dado fazer justiça com as próprias mãos, sob o uso das próprias razões, uma vez que para isto existe o Poder Judiciário, nas esferas federal e estaduais.
Pelo visto, o Estado de Rondônia detinha a posse – ilegal ou não - do terreno onde se acham as obras inacabados do Teatro Estadual. A prova disso é evidente: a própria obra inacabada do Teatro, erigida pela istração Estadual, sem oposição de quem quer que fosse até a ocupação do local pelas tropas do Exército.
Neste caso, o Exército violou a garantia estampada no 5º, LIV da Constituição Federal, segundo a qual ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. Se o Estado de Rondônia detinha a posse do imóvel do Teatro, mesmo ilegalmente, caberia à União Federal, em observância ao dispositivo do 5º, LV da CF, ingressar com a devida ação judicial e não o Exército ocupar em armas o imóvel, numa afronta descabida às instituições públicas democráticas da República.
Agora, se o Exército entende que o imóvel lhe pertence, isto é um inacreditável equívoco. O Exército não tem nada. Tudo o que o Exército tem pertence à União Federal, até porque sequer personalidade jurídica possui quaisquer das três Armas da República.
Induvidoso que se trata de uma disputa possessória e o modo de se resolver a questão é muito simples e prático. A Advocacia Geral da União - provocada pela Unidade do Exército interessada - poderia muito bem ter entrado com uma ação de reintegração de posse com pedido de provimento liminar junto à Justiça Federal. Este seria o caminho correto e legal e não a ocupação pura e simples do imóvel em armas, num assombroso espetáculo de exibição desnecessária de força.
A operação militar ocorrida no Teatro Estadual é rigorosamente ilegal, porque ao Exército é dado a defesa da Pátria e à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes poderes constitucionais, a garantia da lei e da ordem (CF, 142).
Deste modo, jamais poderia o Exército afrontar um dos poderes da República, no caso, o Poder Executivo do Estado de Rondônia, por absoluta vedação legal estampada no 142 da Magna Carta, quando diz “e, por iniciativa de qualquer destes poderes constitucionais, a garantia da lei e da ordem”.
Por fim, agiu bem o governador Ivo Cassol, que não se intimidou com a atitude extremada do Exército e partiu para o debate sereno e firme em defesa dos interesses do nosso Estado, expondo inclusive que são inúmeros os órgãos federais que funcionam em terrenos de domínio do Estado de Rondônia e nem por isso o Governo do Estado jamais tentou retomá-los sob o fogo da PM.
(*) ERNANDE SEGISMUNDO, é advogado portovelhense.